O livro Azul Instantâneo de Pedro Vale nasceu da reunião de poemas e textos postados anteriormente em uma rede social. Dona de um arrojado projeto gráfico, a obra nos convida a desvendar a essência visual do poema. Para isso é necessário se reconstruir, se permitir a conexão com a matéria do imprevisível e imaginário. Nada é fácil e constante. Pedro oferta a dúvida, o abismo, a palavra-sopro, a convulsão. Para o poeta o poema é letal e expande-se na peregrinação pela existência. Há sempre um pulsar, um despertar áspero-suave pronto para provocar o desejo, a revolta e denunciar a dor de existir:
Forais, tristeza, maresia, merda da fazenda, bênção, distinção,reforma secular, implicação, falsa sensibilidade, alicate, resposta,espanto, fratura ou reboque lateral.Alheamento absurdamente temperamental.Trecho do poema Tecetera e talA obra não parece ser atrelada a um tema específico, algo que sustente a linearidade da sua estrutura narrativa, porém o leitor não precisa juntar pistas, elaborar teorias do inconsciente para mergulhar no tempo onde Pedro não suporta o cansaço, mas tece fios de esperança e desenha imagens de uma melancolia nobre e sincera. Os versos reverberam uma nostalgia fotográfica, uma urgente saudade do futuro. O poema é memória. Pedro Vale na sua voraz produção espelha sua condição estrangeira em águas onde nadam náufragos e navios fantasmas. O autor escreve sua carta, seu mapa de sensações:
...
É preciso viver sem paixões.
Mergulhar no absoluto anonimato,
Permanecer morto ou vivo até ao fim.
Aclamar o tumulto escuro e bruto.
Encenar o drama clemente e lento.
Sentir um amor ideal por anjos nebulosos.
Descobrir um novo fundo de poesia e aguardar
uma voz que nos ordene docilmente:
- Não te movas, nem te inquietes, nem traias o que
ainda não
és.
...
Azul Instantâneo é também uma jornada transmutada em prosa poética. Pedro desafia signos e a "arquitetura" do poema, Um confronto ácido, um sonho fácil, uma realidade difícil, uma paisagem, uma música sem definição, poema concreto, sem rimas, sem fim:
...
Deitada na praia, fecho os olhos e recordo tudo aquilo que ainda não vi.